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sábado, 24 de janeiro de 2015

GUO Astronomia: PLANETAS COM DOIS SÓIS SÃO COMUNS


O Universo é ainda mais interessante — e propício ao surgimento da vida — do que se supunha até agora. Um novo estudo feito por astrônomos americanos acaba de demonstrar que planetas que têm dois sóis são extremamente comuns, talvez até mais prevalentes do que os sistemas planetários em torno de estrelas solitárias, como o nosso Sol. É uma surpresa, porque até bem poucos anos atrás imaginava-se que a presença de duas ou mais estrelas girando em torno de um centro de gravidade comum em geral inibisse o surgimento de sistemas planetários estáveis. O novo trabalho, produzido com dados do telescópio espacial Kepler combinados a observações feitas em terra, sugere outra coisa. Aparentemente, a chance de encontrar um planeta em torno de uma estrela solitária, como o Sol, é praticamente a mesma de achá-lo ao redor de um astro duplo. É interessante e empolgante que sistemas de exoplanetas com companheiros estelares sejam muito mais comuns do que se acreditava até uns poucos anos atrás”, afirmou Elliott Horch, da Universidade Estadual do Sul de Connecticut, nos Estados Unidos, primeiro autor do trabalho, aceito para publicação no “Astrophysical Journal”.
Como cerca de 40% a 50% de todas as estrelas na Via Láctea são binárias, o trabalho permite duas conclusões importantes: a primeira é a de que o Universo é na verdade muito mais amigável à formação de planetas estáveis — e, portanto, ao surgimento da vida — do que antes se imaginava.
A segunda, apenas aparentemente desanimadora, é a de que ainda temos que comer muito arroz-com-feijão para compreender em detalhe os processos que levam à formação de sistemas planetários nas variadas arquiteturas observadas lá fora. Mas isso na verdade é razão para festa entre os astrônomos. Em ciência, o prazer do desafio está nas dúvidas, não nas certezas. Afinal de contas, quem diria, alguns anos atrás, que um planeta com dois sóis, como o fictício Tatooine (lar de Anakin e Luke Skywalker na saga “Star Wars”), seria tão comum na Via Láctea quanto planetas como a Terra, orbitando um Sol solitário? É uma surpresa, e das boas.
A DESCOBERTA
O primeiro passo do trabalho americano foi escolher cerca de 600 estrelas observadas pelo Kepler que tinham algum sinal de planetas ao seu redor. O satélite detectava esses indícios na forma de uma pequena redução momentânea de brilho da estrela (como se um planeta estivesse passando à sua frente, bloqueando parte da luz). Nem todos são mesmo planetas, mas sabe-se que os falsos positivos equivalem a cerca de 10% do total.
É importante mencionar que o Kepler detecta apenas uma pequena fração de todos os planetas existentes na região do céu para o qual ele está apontado, que por sua vez corresponde a apenas 0,25% de toda a abóbada celeste. Somente aqueles sistemas planetários que estão alinhados de modo que o planeta passe à frente da estrela em nossa linha de visada acabam identificados.
Pois bem, o grupo pegou essas 600 estrelas com potenciais planetas e as observou, usando para isso telescópios em solo, com uma técnica relativamente recente chamada de “speckle” (algo como “salpico”, em português). A ideia é registrar muito rapidamente a luz dessas estrelas, abrindo e fechando a captação em uma fração de segundo, de forma a coletar a menor quantidade possível de fótons (partículas luminosas). Por quê? Se você capta muita luz, as estrelas — brilhantes como são — “estouram” seu brilho na imagem e você não consegue enxergar se o astro é solitário ou tem algum companheiro estelar menos brilhante próximo. São obtidas várias imagens, que depois são combinadas e processadas numa só por um sofisticado programa de computador. Com o “speckle”, é possível identificar que estrelas são binárias.
Dos 600 objetos observados com essa técnica nos observatórios Gemini Norte, no Havaí, e WIYN, em Kitt Peak, no Arizona, os astrônomos conseguiram detectar 49 que muito provavelmente são estrelas duplas. Em paralelo, eles rodaram simulações para descobrir que percentual das estrelas duplas seriam detectadas pelo método (nem todas seriam, dependendo da distância entre os astros ou da possibilidade de um estar à frente do outro na captação da imagem). Juntando as duas coisas, eles chegaram à conclusão de que tanto faz se a estrela é solitária ou dupla — a chance de haver planetas ao seu redor é aproximadamente a mesma.
NOVAS INCERTEZAS
O resultado também é um ótimo exemplo de como é complicado caracterizar os sistemas planetários com precisão, diante das poucas informações que temos. O tamanho do planeta detectado, por exemplo, é estimado com base no quanto da luz da estrela é bloqueada — ou seja, da relação de proporção entre o diâmetro da estrela e do planeta. Contudo, se de repente descobrimos que o astro é duplo, e não simples, tem mais luz vindo na nossa direção do que antes imaginávamos. Com isso, o planeta tende a ser maior do que a estimativa original. Outra coisa é que, se a estrela é dupla, fica difícil saber em torno de qual das duas estrelas — ou, se bobear, em torno de ambas — o planeta está girando.
Por isso a importância da complementaridade das diversas técnicas de detecção e estudo de exoplanetas. É como se, a cada sistema planetário, os cientistas estivessem montando um quebra-cabeças diferente. E por vezes ter só uma parte das peças não permite que a gente veja que figura ele vai formar. Não é à toa que o Mensageiro Sideral considera esta uma época especial na história da humanidade. Estamos, devagar e com cuidado, começando a compreender toda a grandeza criativa do Universo. E a era das grandes descobertas está apenas começando. Os próximos anos serão de arrepiar.

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