Ilustração dos exoplanetas que orbitam suas estrelas na direção "errada", ou em órbitas retrógradas. O último planeta, no canto inferior direito, é mostrado para ilustração, tendo uma direção orbital "normal".[Imagem: ESO/A. C. Cameron]
A descoberta de nove novos exoplanetas, não deveria chamar muito a atenção - afinal, os planetas fora do Sistema Solar conhecidos até agora passaram a somar nada menos do que 452. *(Na época desta matéria)
Contudo, ao cruzar os dados com observações anteriores de exoplanetas em trânsito, os astrônomos surpreenderam-se com o fato de que seis deles orbitam na direção oposta à da rotação da sua estrela hospedeira - precisamente o contrário do que se passa no nosso Sistema Solar.
Estas novas descobertas virtualmente jogam por terra as atuais teorias da formação dos planetas.
"Esta é uma verdadeira bomba que estamos lançando sobre o campo dos exoplanetas," diz Amaury Triaud, do Observatório de Genebra que, juntamente com Andrew Cameron e Didier Queloz, lidera a maior parte da campanha de observações que permitiu estas descobertas.
Teoria da formação dos planetas
A teoria atual de formação dos planetas propõe que os planetas nascem de um disco de gás e poeira que circunda uma estrela jovem.
Como esse disco protoplanetário gira na mesma direção da estrela, a teoria resultava em que os planetas formados a partir desse disco orbitariam, mais ou menos, no mesmo plano e se moveriam ao longo das suas órbitas na mesma direção que a rotação da estrela.
Esta é cara do nosso Sistema Solar. Como somente há poucos anos os cientistas começaram a descobrir planetas orbitando outras estrelas, não é de estranhar que a teoria que tentava explicar a formação de todos os planetas resulte em sistemas planetários exatamente iguais ao nosso - o único observado até então.
Planetas fora do eixo e na contramão
Depois da detecção inicial dos nove novos exoplanetas, com o instrumento WASP (Wide Angle Search for Planets), a equipe de astrônomos utilizou diversos outros aparelhos para confirmar as descobertas e caracterizar os exoplanetas em trânsito encontrados tanto neste novo rastreamento como nos anteriores.
Surpreendentemente, quando a equipe combinou os novos dados com as observações mais antigas, descobriu que mais de metade de todos os exoplanetas do tipo Júpiter quente estudados tem órbitas desalinhadas com o eixo de rotação das suas estrelas hospedeiras.
A equipe descobriu ainda que seis exoplanetas desta extensa amostragem (dos quais dois são descobertas novas) têm movimentos retrógrados: eles orbitam a sua estrela na direção "errada", ou na contramão.
"Estes novos resultados desafiam claramente o conhecimento convencional de que os planetas devem sempre orbitar na mesma direção da rotação das suas estrelas," afirma Andrew Cameron, da Universidade de St Andrews, na Inglaterra. Foi ele quem apresentou estes novos resultados no Encontro Nacional de Astronomia do Reino Unido, que está acontecendo esta semana em Glasgow.
Consertando a teoria da formação planetária
A origem dos exoplanetas do tipo Júpiter quente é um enigma desde a descoberta do primeiro deles, há cerca de 15 anos. São planetas com massa similares ou maiores do que a de Júpiter, mas que giram em alta velocidade em órbitas muito próximas da sua estrela.
Os astrônomos acreditam que os núcleos dos planetas gigantes se formam de uma mistura de partículas de rocha e gelo, material que se encontra apenas nas regiões mais frias e afastadas do sistema planetário.
Desde modo, estes exoplanetas deveriam formar-se longe da sua estrela - novamente, uma influência clara sobre a teoria do material observacional até agora disponível, ou seja, o nosso próprio Sistema Solar.
Para dar conta dos novos dados, a partir da descoberta desses exoplanetas gigantes gasosos, os astrônomos teorizaram que eles se formariam como sua teoria estabelecia e, só depois, migrariam para órbitas mais interiores, muito mais próximas da estrela hospedeira.
Eles afirmam que este fenômeno poderia ser explicado por interações gravitacionais com o disco de poeira a partir do qual os planetas se formam, em um cenário a se desenrolar ao longo de alguns milhões de anos, resultando numa órbita alinhada com o eixo de rotação da estrela hospedeira. Este cenário permitiria igualmente a formação subsequente de planetas rochosos do tipo da Terra.
Infelizmente, esta hipótese não explica as novas observações.
Consertando a teoria - Tentativa 2
Acostumados com o nosso Sistema Solar, os cientistas acreditavam, com base em sua teoria de formação planetária, que todos os planetas deveriam orbitar suas estrelas mais ou menos no mesmo plano. Vários dos exoplanetas descobertos não obedecem a esta "regra". [Imagem: ESO/L. Calçada]Para explicar os novos exoplanetas retrógrados agora descobertos, uma teoria de migração alternativa sugere que a proximidade desse tipo de exoplaneta em relação às suas estrelas não se deve a interações com o disco de poeira, mas sim a um processo de evolução mais lento que envolve uma "luta" gravitacional com companheiros planetários ou estelares mais distantes, durante centenas de milhões de anos.
Depois que essas perturbações gravitacionais levam um exoplaneta gigante a uma órbita inclinada e alongada, este sofrerá fricções de maré, perdendo energia cada vez que a sua órbita o aproxima da estrela. Deste modo, ele ficará eventualmente "estacionado" numa órbita quase circular, mas inclinada de maneira aleatória, próximo da estrela hospedeira.
"Um efeito secundário dramático deste processo seria o de que qualquer pequeno planeta do tipo da Terra seria varrido destes sistemas," diz Didier Queloz do Observatório de Genebra. É isto que fez com que os astrônomos afirmarem que, provavelmente, estrelas que possuem gigantes gasosos em suas proximidades não teriam planetas rochosos como a Terra.
Dois dos novos exoplanetas retrógrados descobertos possuem companheiros de grande massa, mais distantes, que poderiam ser as potenciais causas do efeito agora teorizado.
Como se formam os planetas
Se é muito cedo para afirmar que a nova hipótese se estabelecerá como uma nova teoria de formação planetária, uma coisa pelo menos é certa: os astrônomos vão se dedicar ainda com mais afinco na busca de novos exoplanetas, de forma a terem uma amostra observacional que os permita novamente criar uma explicação para a pergunta que não vai parar de ser feita: como se formam os planetas?
Esta teoria alternativa de "luta gravitacional", embora não seja exaustiva e não elimine novas propostas, deverá suprir a lacuna - pelo menos até que se descubra um sistema planetário que tenha tanto um gigante gasoso quanto um planeta rochoso menor.
Observatórios robóticos
Os nove novos exoplanetas foram descobertos pelo instrumento WASP (Wide Angle Search for Planets).
O WASP tem dois observatórios robóticos, cada um com oito câmaras de grande ângulo que monitoram o céu continuamente à procura de eventos de trânsito planetário.
Um trânsito planetário ocorre quando um planeta passa à frente da sua estrela hospedeira - em relação à Terra - bloqueando temporariamente parte da radiação emitida pela estrela e que chega até nós.
As oito câmaras de grande ângulo conseguem monitorar milhões de estrelas simultaneamente, tentando detectar esses raros acontecimentos de trânsito.
Planeta em trânsito
Para confirmar a descoberta e caracterizar um novo planeta em trânsito, é necessário fazer um estudo de velocidade radial para detectar as oscilações da estrela hospedeira em torno do centro de massa comum (estrela + planeta).
Isso é feito com uma rede internacional de telescópios equipados com espectrômetros muito sensíveis. No hemisfério Norte o Nordic Optical Telescope, instalado nas ilhas Canárias, e o instrumento SOPHIE, montado no telescópio de 1,93 metro do Observatório de Haute Provence, na França lideram a busca.
No hemisfério Sul, o HARPS, montado no telescópio de 3,6 metros do ESO, e o espectrômetro CORALIE, montado no telescópio suíço EULER, ambos em La Silla, no Chile, foram utilizados para confirmar a descoberta dos novos planetas e medir o ângulo que a órbita de cada planeta faz com o equador da respectiva estrela.
Os telescópios robóticos Faulkes, situados no Havaí e Austrália, forneceram medições de brilho para a determinação do tamanho dos planetas.
Planetas gigantes gasosos
Exoplanetas do tipo Júpiter quente, também chamados gigantes gasosos, são planetas com massas similares ou maiores do que a de Júpiter, que orbitam as suas estrelas hospedeiras em órbitas muito mais próximas da estrela do que qualquer planeta do nosso Sistema Solar se encontra do Sol.
Como são grandes e estão próximos da estrela hospedeira, eles são mais fáceis de detectar através do seu efeito gravitacional sobre a estrela e, ao mesmo tempo, têm maior probabilidade de passar à frente da estrela.
A maior parte dos primeiros exoplanetas descobertos pertence a esta classe de objetos. Apenas no início de 2010 foi anunciada a descoberta do primeiro exoplaneta temperado, com temperaturas mais baixas, e que foi brindado pelos astrônomos como uma verdadeira Pedra de Roseta planetária.
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