Em 2015 os físicos estão comemorando o centenário da Teoria da Relatividade Geral, de Albert Einstein, que, entre outras coisas, quebrou a ideia do tempo e do espaço como entidades absolutas, colocando em seu lugar o espaço-tempo, uma entidade elástica que se curva sob ação da massa e da energia para dar origem à gravidade.
Apesar do sucesso extraordinário da Relatividade Geral - da sua capacidade de explicar e fazer previsões sobre a realidade -, nenhuma teoria explica tudo - por exemplo, como surgiu o próprio espaço-tempo?
Assim é que, passados 100 anos, alguns físicos começam a questionar esses postulados básicos de Einstein.
O físico Lee Smolin há algum tempo defende que o tempo é uma entidade fundamental da natureza. A física portuguesa Marina Cortês também não se importa em fugir das maiorias, e vem defendendo uma teoria alternativa ao Big Bang, a teoria dos multiversos.
Quando os dois resolveram trabalhar em conjunto, no Perimeter Institute, era visto que o resultado seria algo de impressionar. De fato, as ideias da dupla acabam de receber um prêmio internacional, o Prêmio Buchalter, idealizado "para estimular trabalhos inovadores teóricos, observacionais ou experimentais em cosmologia que desafiem, estendam ou iluminem os modelos atuais e/ou ajudem a explicar a expansão cósmica a partir dos primeiros princípios."
Tempo é entidade absoluta e fundamental, defendem físicos
Recentemente outros físicos propuseram que o espaço-tempo pode ficar turbulento e gerar redemoinhos de gravidade. [Imagem: Henze/NASA]
Conjuntos causais energéticos
Recentemente outros físicos propuseram que o espaço-tempo pode ficar turbulento e gerar redemoinhos de gravidade. [Imagem: Henze/NASA]
Conjuntos causais energéticos
No artigo que lhes deu o primeiro lugar, "O Universo como um Processo de Eventos Únicos", os dois propõem um novo quadro para a cosmologia, que eles chamam de "Conjuntos Causais Energéticos".
Os dois físicos partem da hipótese de que o tempo é fundamental e irreversível - uma afirmação ousada, uma vez que a maioria dos físicos, na esteira de Einstein, entende o tempo como uma propriedade que "emerge" como uma consequência de leis físicas mais fundamentais.
Segundo eles, a causalidade - a chamada seta do tempo - resulta diretamente dessa irreversibilidade; o futuro é criado continuamente a partir do presente por meio da atividade do tempo; energia e momento são da mesma forma propriedades fundamentais; o espaço-tempo, e as partículas que se deslocam no seu interior, emergem através da atividade do tempo, mais uma vez em oposição direta ao ponto de vista predominante entre os físicos.
Nesse novo quadro, cada evento tem uma "impressão digital" única - a soma das assinaturas dos eventos que o precederam, e não outros.
Estes fundamentos resultam em um universo que é tão assimétrico quanto possível. A dupla desenvolve sua teoria analiticamente, ilustrando-a por meio de simulações numéricas de um modelo simplificado de universo em que o espaço tem apenas uma dimensão.
Tempo é entidade absoluta e fundamental, defendem físicos
Seja o tempo fundamental ou não, o fato é que alguns físicos falam em procurar viajantes do tempo usando a internet. [Imagem: Cortesia BBC]
Unificação da mecânica quântica com a relatividade
Seja o tempo fundamental ou não, o fato é que alguns físicos falam em procurar viajantes do tempo usando a internet. [Imagem: Cortesia BBC]
Unificação da mecânica quântica com a relatividade
Em dois artigos subsequentes, a dupla elabora melhor as proposições apresentadas no primeiro trabalho, desenvolvendo uma versão quântica da sua teoria dos Conjuntos Causais Energéticos, e a vincula a uma proposta já existente para unir mecânica quântica e espaço-tempo, chamada de Gravidade Quântica em Circuito Fechado (Loop Quantum Gravity).
O novo quadro teórico traz implicações diretas para a física fundamental - na verdade, a dupla argumenta que a primazia do tempo, e sua irreversibilidade, devem ser incorporados à física contemporânea a fim de permitir fazer progressos em questões fundamentais que se mantêm não resolvidas. Os autores acreditam que, em última instância, sua teoria pode apontar o caminho para a unificação da mecânica quântica com a relatividade.
"Este trabalho em particular é especial, já que é desafiador e intransigente no estabelecimento de uma nova direção. Foi preciso coragem e determinação para publicá-lo, de modo que vê-lo reconhecido é uma recompensa além da imaginação," comentou Marina Cortês sobre a premiação.
"É humilhante e inesperado receber o Prêmio Buchalter inaugural para este trabalho de risco, no qual nós colocamos de lado teorias há muito estabelecidas para começar do zero a formular uma abordagem para os profundos problemas que a cosmologia dos primeiros princípios enfrenta," acrescentou Smolin.
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